domingo, 9 de outubro de 2011

A cerveja é o novo vinho

A bebida preferida nos botecos brasileiros ganha espaço nas mesas de degustação. Saiba mais sobre o lado sofisticado do mercado de cervejas. Ao final da matéria, convidamos você a descobrir se conhece mesmo alguma coisa de cerveja e a fazer um teste para saber que estilo vai com cada copo

Você já as conhece provavelmente desde a primeira festa da faculdade. Loiras, morenas, ruivas, mulatas, até índias, as cervejas são, desde o século XIX, a bebida do gosto geral do brasileiro. Mas a cerveja não é mais apenas aquela bebida barata da mesa do boteco. Os brasileiros começam a apreciá-la como produto de degustação. Assim como o vinho tem seus adeptos, a cerveja ganha seus fãs – e cursos e bares especializados para atender esse público.

A história da cerveja remonta a 8 mil anos – as primeiras provas arqueológicas vêm da região da Mesopotâmia, onde ficava a Suméria. No Egito, há esculturas que mostram a fabricação da bebida. Na Europa, ela começou a ser fabricada em monastérios, na Idade Média, e logo passou a ser consumida amplamente em todo o continente.

“A partir daí, a cerveja se expandiu bastante pelo mundo todo”, diz a sommelier de cervejas Kathia Zanatta. Segundo ela, que foi a primeira brasileira a se formar sommelier, na Alemanha, a cerveja começou a perder seu status de bebida sofisticada e se massificou depois da Segunda Guerra Mundial, quando a pilsen tomou conta do mercado e levou ao esquecimento de diversos outros estilos de cerveja. “Hoje, o momento que vivemos é o que se costuma chamar de Renascimento da cerveja, que traz de volta a cultura cervejeira, principalmente com as cervejarias artesanais”, afirma Kathia.

O cervejeiro Alexandre Sigolo – sócio da microcervejaria Sinnatrah, que promove cursos de preparo da bebida em São Paulo – diz que a cerveja não virou vinho agora e que ela sempre foi sofisticada. “O que aconteceu é que aprendemos a olhar para ela”, afirma.
Bebida de classe

Kathia e o marido, o também sommelier de cervejas Alfredo Luis Barcelos, ministram, na capital paulista, um dos únicos cursos em todo o país para a formação de “beer sommeliers”. A enorme procura – há listas de espera para as próximas duas turmas (e são apenas duas por ano) – reflete o interesse das pessoas na bebida. E engana-se quem acha que só buscam as aulas as pessoas que querem se tornar sommeliers. Grande parte dos alunos se inscreve porque deseja apenas conhecer mais sobre a cultura cervejeira.




A psicóloga Cristiana Bratt e seu marido, Alexandre Bratt, procuraram o curso de sommelier de cervejas para conhecer melhor a bebida. (Foto: Alfredo Luis Barcelos / Acervo Pessoal)

A farmacêutica Grasiela Corsini faz as aulas por puro hobby. “Gosto de cervejas. Gosto de cervejas especiais, e adoro harmonizar tudo isso. Percebi, fazendo este curso, que não conhecia nada dessa bebida”, diz. Ela afirma ter aprendido a diferenciar os estilos, e até se arriscaria a ajudar amigos a escolher, nem que fosse na mesa do bar, a melhor cerveja.

O gosto pela bebida também influenciou bastante o casal de alunos Cristiana e Alexandre Bratt, que hoje pretende montar um negócio por causa da paixão pela cerveja. “É uma bebida que combina com qualquer coisa e é muito sociável. Ninguém bebe cerveja sozinho, por exemplo. Não existe isso”, diz Cristiana que é psicóloga.

A profissão de sommelier cervejeiro nasceu na Alemanha. No mundo da cerveja, essas pessoas convivem lado a lado com o mestre cervejeiro, profissional que comanda o processo de fabricação da cerveja. “Não só no Brasil, mas na grande maioria dos países, as pilsen dominaram mercados e acabaram virando sinônimo de cerveja; o sommelier de cerveja tem o dever de ensinar as pessoas que existem estilos diferentes da bebida além das pilsen”, afirma Kathia.

Hoje, no mundo, existem quase cem tipos de cerveja. Cada uma tem características bem próprias, e, assim como o vinho, vão melhor com certos tipos de comida. Para Alexandre Sigolo, porém, o importante é cada um fazer sua própria harmonização e beber a cerveja como achar melhor e com a comida que gostar. Mas, ainda assim, o cervejeiro reconhece que há uma forma correta de servi-las.


Atenção aos mínimos detalhes

Inclinação do copo na hora de servir, a distância da garrafa para a boca do copo e até a cor da própria garrafa influenciam o sabor e a experiência de degustar a cerveja. Já se perguntou, por exemplo, por que a maioria das garrafas são marrons bem escuras? “Toda cerveja reage à luz do Sol. Se você deixar mesmo as de garrafas escuras por quatro horas ou mais ao Sol, o lúpulo vai reagir e dar um gosto estranho”, afirma o sommelier Alfredo Luis Barcelos.

Outro elemento para servir adequadamente a bebida é o copo utilizado. Se engana quem acha que cerveja foi feita para o nosso tradicional copo americano; que ele e a bebida são “casados”. O cervejeiro Igor Michiels que o diga. Michiels é belga e mora na cidade de Mechelen. Ele edita alguns dos principais sites sobre a bebida em seu país, dentre eles o bierkonvent.be, um dos maiores catálogos cervejeiros de toda a Bélgica. Seu país é uma das mais tradicionais nações cervejeiras do mundo – há inclusive uma rixa entre eles e os alemães pelo posto de país oficial –, e lá o modo de servir a bebida é levado muito a sério. Cada cervejaria produz seu próprio copo, desenhado para que o consumidor tenha a mais completa experiência sensorial ao tomar sua cerveja.




“Uma boa cerveja vem apresentada de maneira elegante, distribuída perfeitamente pelo copo, sem enchê-lo, de forma que você fique com água na boca só de olhar. É o mesmo com a comida; a apresentação é fundamental na hora de servir uma cerveja. Além disso, alguns copos possuem uma tradição ou até mesmo uma história”, diz Michiels.

O belga diz que o design de cada copo influencia no sabor, uma vez que as diferentes distribuições do líquido afetam de maneiras distintas a percepção olfativa das pessoas – e, como se bem sabe, o olfato e o paladar estão intrinsecamente ligados. “Quando uma pessoa bebe uma cerveja específica em seu copo específico, ela nota um sabor diferente do que sentirá caso tome a mesma cerveja em uma tulipa comum ou em um copo americano – muitas vezes sabor até distante do que a cerveja realmente se propõe a ter”, afirma Michiels.


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